No bairro da Beira-Mar, em Aveiro, durante cinco dias, há devoção, bairrismo, cavacas, animação e muitas expressões como “Ó meu rico São Gonçalinho” . A festividade está inscrita no Inventário Nacional do Património Cultural e por devoção ao santo serão atiradas dez toneladas de cavacas.
Nem o frio nem a chuva impediram, esta sexta-feira, que as pessoas, à semelhança de anos anteriores, afluíssem ao Bairro da Beira-Mar para participarem nas Festas de São Gonçalinho, em Aveiro. Durante cinco dias (9 a 13), a fé e a devoção tomam conta da cidade, numa sucessão de rituais festivos, com séculos de existência.
A festividade é célebre pelo arremesso de cavacas do cimo da capela do bairro, arremessadas por muitos devotos em pagamento de promessas ao santo, agradecendo o seu poder de cura de doenças ósseas e a sua capacidade de resolver problemas conjugais e amorosos.
Além das famosas cavacas, o licor de Alguidar também já se transformou na “bebida oficial” das festas de São Gonçalinho. Para quem está mais próximo do santo, quem o venera, ou melhor, quem faz o licor em casa, é um sabor que remonta ao passado, mas que se revela uma agradável novidade para quem o prova pela primeira vez, mais de 100 anos após a sua criação, tornando-se, hoje, um sabor tão tradicional de Aveiro.
Lurdes Silva vem de Estarreja todos os anos para cumprir a promessa. “É o meu protetor. Tive um problema nos ossos e ele tem-me ajudado”, contou à Agência de Informação Norte. A juntar a tudo isto, revela que gosta do ambiente vivido no bairro. “É uma festa muito familiar, as pessoas estão muito felizes, a capela é linda”, lamentando que o tempo “não está a ajudar”.
“Esta festa não se explica. Sente-se”
Joana e Miguel Oliveira vieram cumprir a promessa. Tocaram o sino antes de lançar as cavacas. Cada um carregava um saco de cinco quilos. “Esta festa não se explica. Sente-se”, refere Joana enquanto lançava o doce tradicional e de textura rija. “Tínhamos que vir hoje, precisamente no dia consagrado a São Gonçalo (10 de janeiro). Promessas são promessas”, refere Miguel.
Por seu turno, Nuno Portela, o juiz da Mordomia, reforça “a força” da tradição na cidade e, em particular, no bairro. Garante que “quem vem a primeira vez, volta sempre”, desafiando quem “não conhece, venha conhecer”. Uma festa de rua, neste primeiro mês do ano, comporta sempre o risco de ser afetada pela chuva. Apesar dos principais concertos decorrerem numa tenda fechada, montada no renovado largo do Rossio, o mau tempo pode sempre afastar algum público, diz Nuno Portela.
“A festa de São Gonçalinho é uma tradição muito peculiar, muito única. Não é uma festa igual às outras. Marca a diferença porque é atirado um doce de uma torre de uma capela. É algo único”, refere o juiz. O ritual repete-se várias vezes ao dia. O toque do sino da capela alerta que vão ser lançadas cavacas. Em 2024, a Mordomia vendeu 6,5 toneladas daquele doce típico; este ano, de acordo com a organização, o número poderá ser superior. “Nos cinco dias, serão atiradas cerca de toneladas de cavacas”, refere Nuno Portela. Também o lançamento das cavacas do alto da capela, um dos momentos mais icónicos das festividades, ficam “sempre condicionados”. “A chuva é o nosso maior inimigo e receio”, assume.
“As cavacas são as rainhas da festa”
Maria Piedade vende cavacas há cinco anos nas festas de São Gonçalinho, em Aveiro. Em declarações à Agência de Informação Norte, revela que o negócio “não está muito famoso”, e aponta a “chuva” como causa principal. “É uma festa com muita tradição, e as cavacas são as rainhas da festa.” Explicou-nos que as cavacas lançadas da capela são as mesmas que vende na sua barraca. “A massa é a mesma. Não há cavacas de primeira ou segunda. As de São Gonçalinho são estas. Duras”, e cada saco de um quilo está à venda na sua tenda a seis euros.
De salientar que o Instituto Público Património Cultural aprovou a inscrição das Festas de São Gonçalinho no Inventário Nacional do Património Cultural Imaterial (INPCI), no domínio “Práticas sociais, rituais e eventos festivos”. Segundo nota da Câmara de Aveiro, a aprovação da candidatura da inscrição da festa no INPCI foi comunicada formalmente à autarquia
pelo Património Cultural no final de 2024. O presidente da autarquia aveirense, Ribau Esteves, manifestou-se satisfeito com a decisão, realçando o simbolismo muito especial de ter acontecido no ano em que Aveiro
foi Capital Portuguesa da Cultura. O processo de candidatura das Festas de São Gonçalinho a património imaterial foi iniciado em 2019 pela Câmara de Aveiro, em estreita articulação com a Mordomia de São Gonçalinho e com a Paróquia da Vera Cruz.
Por: airinformacao.pt